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Em agosto, “Mulheres radicais” desembarca na Pinacoteca

“Limitada” – Foto: Marie Orenzans

A Pinacoteca de São Paulo apresenta, a partir de 18/8, a grande exposição coletiva Mulheres radicais: arte latino-americana, 1960-1985, no primeiro andar da Pinacoteca. A mostra tem curadoria da historiadora venezuelana Cecilia Fajardo-Hill e da pesquisadora argentina Andrea Giunta e é a primeira na história a levar ao público um significativo mapeamento das práticas artísticas experimentais realizadas por artistas latinas e a sua influência na produção internacional. Quinze países estarão representados por 120 artistas, reunindo mais de 280 trabalhos em fotografia, vídeo, pintura e outros suportes.  A apresentação na capital paulista conta com a colaboração de Valéria Piccoli, curadora-chefe da Pinacoteca.

A exposição aborda uma lacuna na história da arte ao dar visibilidade à surpreendente produção, realizada entre 1960 e 1985, dessas mulheres residentes em países da América Latina, além de latinas e chicanas nascidas nos Estados Unidos. Entre elas, constam na mostra algumas das artistas mais influentes do século XX — como Lygia Pape, Cecilia Vicuña, Ana Mendieta, Anna Maria Maiolino, Beatriz Gonzalez e Marta Minujín — ao lado de nomes menos conhecidos — como a artista cubana Zilia Sánchez, cujos trabalhos são imbuídos de abstração geométrica e erotismo, a escultora colombiana Feliza Bursztyn e as brasileiras Leticia Parente, uma das pioneiras da vídeoarte, e Teresinha Soares, escultora e pintora mineira que vem recebendo atenção internacional recentemente.

O recorte cronológico da coletiva é tido como decisivo tanto na história da América Latina, como na construção da arte contemporânea e nas transformações acerca da representação simbólica e realista do corpo feminino. Durante esse período, as artistas pioneiras partiram da noção do corpo como um campo político e embarcaram em investigações radicais e poéticas para desafiar as classificações dominantes e os cânones da arte estabelecida. “Essa nova abordagem instituiu uma pesquisa sobre o corpo como redescoberta do sujeito, algo que, mais tarde, viríamos a entender como uma mudança radical na iconografia do corpo”, contam as curadoras. Essas pesquisas, segundo elas, acabaram por favorecer o surgimento de novas veredas nos campos da fotografia, da pintura, da performance, do vídeo e da arte conceitual.

A abordagem das artistas latino-americanas foi uma forma de enfrentar a densa atmosfera política e social de um período fortemente marcado pelo poder patriarcal (nos Estados Unidos) e pelas atrocidades das ditaduras apoiadas por aquele país (na América Central e do Sul), que reprimiram esses corpos, sobretudo os das mulheres, resultando em trabalhos que denunciavam a violência social, cultural e política da época. “As vidas e as obras dessas artistas estão imbricadas com as experiências da ditadura, do aprisionamento, do exílio, tortura, violência, censura e repressão, mas também com a emergência de uma nova sensibilidade”, conta Fajardo-Hill.

Para Giunta, tópicos como o poético e o político são explorados, na exposição, “em autorretratos, na relação entre corpo e paisagem, no mapeamento do corpo e suas inscrições sociais, nas referências ao erotismo, ao poder das palavras e ao corpo performático, a resistência à dominação; feminismos e lugares sociais”. E complementa: “Estes temas atravessaram fronteiras, surgindo em obras de artistas que vinham trabalhando em condições culturais muito diferentes”, completa. Não à toa, a mostra é estruturada no espaço expositivo em torno de temas em vez de categorias geográficas. A curadora da Pinacoteca, Valéria Piccoli, destaca a importância da representatividade das brasileiras dentro da mostra: “além dos nomes que participaram das exposições no Hammer e no Brooklyn Museum, também vamos incluir mais quatro na apresentação em São Paulo”, revela.

A América Latina conserva uma forte história de militância feminista que – com exceção do México e alguns casos isolados em outros países nas décadas de 1970 e 1980 – não foi amplamente refletida nas artes. Mulheres radicais propõe consolidar, internacionalmente, esse patrimônio estético criado por mulheres que partiram do próprio corpo para aludir – de maneira indireta, encoberta ou explícita – as distintas dimensões da existência feminina. Para tanto, as curadoras vêm realizando uma intensa pesquisa, desde 2010, que inclui viagens, entrevistas, análise de publicações nas bibliotecas da Fundação Getty, da Universidade do Texas entre diversas outras.

O argumento central da exposição mostra que, embora boa parte dessas artistas tenham sido figuras decisivas para a expansão e diversificação da expressão artística em nosso continente, ainda assim não haviam recebido o devido reconhecimento. “A exposição surgiu de nossa convicção comum de que o vasto conjunto de obras produzidas por artistas latino-americanas e latinas tem sido marginalizado e abafado por uma história da arte dominante, canônica e patriarcal”, definem as curadoras.  Segundo o diretor da Pinacoteca, Jochen Volz, “foram, principalmente, artistas mulheres as pioneiras que experimentaram novas formas de expressão, como performance e vídeo, entre outras. Assim, a itinerância da mostra Mulheres radicais para o Brasil é de grande relevância para a pesquisa contemporânea artística e acadêmica e o público em geral”.

Esse rico conjunto de trabalhos, bem como os arquivos de pesquisa, coletados para a concepção da exposição, chegam finalmente ao público paulista, contribuindo para abrir novos caminhos investigativos e entendimentos acerca da história latino-americana. “O tópico agora faz parte de uma pauta ampla e ao mesmo tempo urgente. Entretanto, ainda há muito trabalho a ser feito e temos plena consciência de que este é apenas o começo”, finalizam as curadoras.

A exposição

“Mulheres radicais: arte latino-americana, 1960-1985” foi organizada pelo Hammer Museum, de Los Angeles, como parte da Pacific Standard Time: LA/LA, uma iniciativa da Getty em parceria com outras instituições do Sul da Califórnia e teve curadoria das convidadas Cecilia Fajardo-Hill e Andrea Giunta. Sua apresentação na Pinacoteca de São Paulo conta com o patrocínio do Itaú, Escritório Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados e Banco BTG Pactual, além do apoio de JK Iguatemi e revista Claudia.

A exposição foi realizada graças ao apoio da Getty Foundation. A maior parte dos recursos da mostra foram promovidos por Diane and Bruce Halle Foundation e Eugenio López Alonso. Apoio generoso foi oferecido por Vera R. Campbell Foundation, Marcy Carsey, Betty e Brack Duker, Susan Bay Nimoy e Visionary Women.

Exhibition Circle

Pela primeira vez em sua história, a Pinacoteca concebe um Exhibition Circle — prática bastante comum nos EUA e na Europa para arrecadar fundos — especialmente para esta exposição. Para a ocasião, o museu convidou 30 mulheres inspiradoras e pioneiras em suas áreas de atuação para colaborarem financeiramente na viabilização de “Mulheres Radicais”. “Convidamos mulheres que refletem o espírito desta exposição e que, para nós, são fonte de admiração e merecem reconhecimento público. O grupo que chamamos carinhosamente de ´Mulheres Extraordinárias´ representa o engajamento e o pioneirismo feminino em diversas áreas da sociedade”, conta Paulo Vicelli, diretor de Relações Institucionais da Pinacoteca. Integra a lista de homenageadas: Adriana Cisneros, Ana Lucia de Mattos Barretto Villela, Catherine Petigás, Estrellita Brodsky, Luisa Strina, Fernanda Feitosa, Lygia da Veiga Pereira Carramaschi, Luiza Helena Trajano, entre outras.

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